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imagem pública tirada da net
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VAGABUNDAGENS...
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um teto de madeira
todo pintado de branco
uma clarabóia
aberta no topo do telhado
onde os gatos se abeiram
e marcam
emanações odoríferas
que ondulam
se ampliam determinantes
duma existência vadia
uma casa amputada
sobranceira à sua quietude
na obliquidade
que o tempo tardiamente
arruinou
pátria de formigas
de pequenas aranhas corredias
também no cérebro das pessoas
que nela habitam
numa existência erradia
um espaço infinito
azul à vezes cinzento outras
de negro doirado
onde balança a nave térrea
que sustém a casa
as vidas que nela pernoitam
se constroem sonhos
se esgrimem
desespero e esperança
duma existência vagabunda
uma linha de água
amálgama de microrganismos
torrente líquida cristalina
e de lamas lixos subservientes
que arrastam
se arrastam à velocidade dos ventos
no equilíbrio do abismo
na magia da magnetização lunar
que o expande ou retrai
numa existência transviada
um tempo adúltero
compartimentado em segmentos
de hora minuto segundo
semana mês ano década século
em catadupas de acontecimentos
que se esvaem
ou se fixam e emergem de novo
num mesmo lato estrito conceito
oportunista
duma existência errante
uma estrela guia
que o avanço tecnológico apagou
terá caído? buraco negro
nem deus nem pátria nem amor
apenas um espectro de insolvência
que atravessa o absurdo
das leis físicas ou sobrenaturais
que impelem atracções
erguem barreiras às afinidades
numa existência extraviada
um mar de gente biliões
sitiados pela força da gravidade
nascidos ao acaso
do acaso que limita o tempo da idade
educados para obedecer
desde o berço trabalhar honrar vencer
não importa se a morte
inscrita ou descrita no ADN cósmico
anular o sofrimento
duma existência atribulada
então Zeus imperial
subscreveu o tratado das almas errantes
segundo o qual todos os deuses
e todos os mortais à deriva na paz celestial
cessariam de senso comum
as providências cautelares impostas à humanidade
onde toda a riqueza gerada
pelas artes as ciências e o trabalho
beneficiam do estatuto de bem humanitário
para uma existência sustentável
os mortais ainda indecisos
o ouro das heranças ancestrais
os bens móveis e imóveis topo de gama
as contas bancárias recheadas
uns porque as tinham dentro ou fora bem guardadas
outros porque as almejavam alcançar
e como fazer tão drástica se evidencia a mudança
cessar da vida humana a liderança
da bélica da secreta da religiosa da financeira
que torne a existência sã e amorável
convocarei todo o Olimpo
sobre as ruínas de Atenas à voragem rendida
soprarei ventos moverei terras
entre continentes provocarei terramotos
destruirei bunkers secretos
e todas as mentes de almas criminosas
lançarei a luz do entendimento
para os que de tais acervos fiquem órfãos
varrerei os céus de todos os deuses
para uma existência racionalizada
autor: jrg
MOVIMENTOS ANAIS
minha ambição é toda a alma humana
por ela vou eterno confiante
levo a memória milenar das origens
sonho que do pensamento emana
levo o amor que me fez fiel amante
fantasia que me traz vertigens
*
há um sonho secreto para desvendar
que desde criança me acompanha
faz parte do meu ser mais original
um sonho talvez de olhar o mar
de sentir no vento a alma estranha
ardências do meu fogo visceral
*
ou este pesadelo da alta madrugada
que me acorda em suores frios
entalado entre a mentira a verdade
ante a lei de não ser ou nada
navegante sem rumo por entre rios
à beira de abismos da vontade
*
quem me prende o livre pensamento
a pausa a dúvida a sensaboria
a barbárie que destruiu testemunha
voltar atrás por um só momento
montar de novo tragédia e alegoria
colher do riso e da caramunha
*
sendo alma o instinto humanitário
plena de sensores biocósmicos
agindo no nosso corpo intermitente
em interligações e sem horário
secreto sistema de canais iónicos
que propagam na emoção a mente
*
respiro fundo num olhar alucinado
dentro do sonho outro sopesar
a Terra gira em torno de si mesma
arrasta Lua e Sol apaixonado
e em volta dele majestosa a girar
mantém expectativa do sistema
*
meio século rotação e translação
à roda do eixo belo feminino
a cada movimento avulta descoberta
do novo sentir amor o coração
o sonho revela segredos de menino
na minha alma inculta de poeta
*
conto os anos que passam a correr
nesta avidez de ganhar à morte
desdenho hiatos contemporizadores
filtro luz na esperança querer
procuro o rumo que devolva o norte
traço de união dos meus amores
jrg
o meu sonho é ser duma só pátria
onde a alma pura se evidencia
e não o ser da língua povo ou pária
que na dor me e te silencia
o meu sonho é ser de toda alma humana
no Universo total a expressão
que não se esgota na mente insana
é sangue que bombeia o coração
o meu sonho é amar a alma Universal
onde a Pátria da língua gera a violência
e não este silêncio mesquinho ritual
em que mergulha a falsa independência
o meu sonho é erradicar o medo
desde há milénios na alma instalado
o que cala a verdade no segredo
ainda que viva nesta Pátria exilado
o meu sonho é transformar o mundo
catalogado em números adversos
numa só Nação onde o amor profundo
liberta de conceitos complexos
o meu sonho é plantar na alma a esperança
criando raízes profundas intemporais
que floresça em cada sorriso de criança
e resista sem lesões aos vendavais
o meu sonho é ser homem pleno por inteiro
amante de mim e de toda a natureza
apelo ao consciente da minha inconsciência
que me revele o mistério verdadeiro
porquê a alma assume tão tanta beleza
quando se despe e nua mostra a sua essência
jrg
tela de Carla Cunha
sob os azuis o brilho arrepiante
da emoção que a alma sente
olho os caminhos branqueados de rompante
e vejo a arte em fogo ardente
vejo a pintora de vestido leve
que na agitação da alma se passeia inquieta
em volta da tela fixa um olhar breve
sobre a poesia que rompe da poeta
a cada impulso o traço se acentua
azul cobalto azul de maresia
nervos da carne neurónios pincelada crua
caminhos onde bifurca a poesia
posso decifrar tentáculos de asfixia
uma brisa suave e mansa abana a vestimenta
a pintora se afaga e sorri de alegria
na mão o pincel é a alma que a cor pavimenta
desço a corrente de tons azulados
imagino a beleza abissal do mar profundo
que a tela exibe em sonhos rasgados
onde me detenho louco e de fora do mundo
ah se as palavras pintassem suavidade
se a pintora encontrasse a razão
se na cor onde avulta secreta sensualidade
o poeta sentisse o que norteia a mão
melhor é seguir a corrente da alma sibilina
de onde se espevita bela a esperança
a tela é da pintora a paz da sedução feminina
que exala amor e me propõe uma aliança...
autor: jrg
uma mulher é condenada
a morrer por apedrejamento
pelo crime de adultério
a turba junta as pedras da calçada
alucinados pelo ajuntamento
gritam palavras contra o impropério
o corpo dela encolhido sem apelo
um último olhar de súplica à multidão
os olhos doces de quem ama ser
por um momento o quebra gelo
que rompe da barbárie a solidão
apadrinhada por um sórdido poder
levantam-se vozes no mundo inteiro
porque a mulher é o ser supremo
gera e cria toda a criatura humana
não há ciência nem dinheiro
que altere a dimensão por isso tremo
impotente de travar razão insana
é apenas um corpo só de uma mulher
a alma dela ilesa fixa o mundo
chovem as pedras no corpo que atormenta
nem um grito no seu silêncio de sofrer
os olhos abertos procuram ver ao fundo
quantas das pedras frustração que acorrenta
pego na alma de SAKINEH amortalhada
levanto o estandarte do amor
vou de povo em povo dentro do poema
pelos lugares na Terra onde a mulher humilhada
seja tida como a mãe que resiste à dor
livre do preconceito e da algema
autor: JRG
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