O HOMEM
Um dia o homem
perdeu-se
no matagal da vida
e achou uma conveniência:
sou superior!
e desde então
é vê-lo
a eliminar tudo o que o ofusca
na razão inversa
do seu poder
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Um dia o homem
perdeu-se
no matagal da vida
e achou uma conveniência:
sou superior!
e desde então
é vê-lo
a eliminar tudo o que o ofusca
na razão inversa
do seu poder
Pego na palavra amor. Ostento-a num papel branco onde desenhei a várias cores o A o M o O o R. .
Está perfeito. Primeiro em dégradé de cada uma das cores básicas: o vermelho, o verde, o azul, o amarelo, o preto, Depois utilizo folhas de papel coloridas. Coloco-as uma a uma na frente dos meus olhos, com os óculos de dioptria e meia. Fixo a palavra, a cor, a palavra. Soletro-a. Pronuncio-a em voz baixa. A meia voz. Grito-a. Apaparico-a de tons, suaves, quentes, sussurrantes, agudos, raivosos, blasfemos e volto à ternura que a palavra envolve, que ela pretende ser ainda, desde que a criaram e lhe atribuíram uma significação. A M O R. . .
Sirvo-me de um pequeno binóculo. Aumento a palavra. Reduzo. Aumento
Penso nos poemas exaltados, as odes, a lírica ,a epopeia, o soneto, o verso trepidante a esmo, sem rima, em catadupas de enlevado orgasmo existencial. E na prosa sibilina que génios ou simples escribas de ocasião elevados ao panteão das musas eruditas por lobbies de promíscuas intenções, E em como a palavra resistiu, resiste, no âmago de si própria indecifrável, indetectável o sentimento do sentido, a aferição da grandeza.
Ela, a palavra A M O R. . , continua a ser utilizada por todos na medida das suas conveniências. Mais ou menos ferida de significante erudição.
O amor da mãe pelo seu filho gritado até à exaustão, não a impede de permitir e colaborar na sua violação, do filho, da filha, quando uma outra significação de amor, o próprio ou o carnal, de sexo e orgias consequentes, ou as drogas paradisíacas e ou afrodisíacas ingeridas para suprir a falta de amor e inventar um novo, artificial e efémero, amor que basta no momento e acalma o frenesim da solidão de si, de se não ter, de se não achar.
O amor de amigo, falso, misericordioso. Envolto em enredos desculpabilizantes. Em evasões de raciocínio denso e mirabolante .
O amor de pai como só ele sabe amar. Intransigente. Austero na aplicação das leis primárias e a utilizar a palavra na medida do querer ser ou parecer, como pilar da união, cada vez mais perene, da família e a delegar na mulher dele, mãe dos filhos ou madrasta, a administração do amor quanto baste.
As PALAVRAS alinhadas no absurdo da memória são em si mesmas, apenas palavras, caracteres com significados e intenções e leituras subjectivas. Têm força e vida própria mas precisam de emissor e receptor para se afirmarem como fundamentais.
A PALAVRA mãe. Mulheres que exultam de alegria, que se doam inteiras, que abdicam dum todo que as fazia ser mulher. Que se desencontram abjectivamente do ser e do estar, dos objectivos que um dia se colocaram. E se dedicam inteiras aos filhos, aos filhos dos filhos.
A PALAVRA amor. Amor de amigo, amor de sexo, amor de mim, amor da vida. E ninguém sabe o que é. Como se define, caracteriza. Porque sendo um estado ambivalente do ser, que congrega em si as frustrações e a consistência da consumação, a ira e a ternura, a felicidade e o desdém, o mito e a realidade , a banalidade e o ênfase .
A PALAVRA dinheiro. Em nome do qual se chacinam pais, amigos, filhos e se renega o amor. Direi que é a palavra mais cínica do alfabeto conhecido. Incita a ódios e a vinganças. Ninguém escapa à estrábica visão do dinheiro. A traição, o crime, a abjecção de tudo o que mexe e implique dinheiro. Até os padres de todas as religiões.
A PALAVRA religião. Antes da invenção das palavras, os seres hominídeos já fornicavam entre si para a proliferação da espécie. Não tinham deuses nem santidades instituídas . Mas tinham medos. Simplesmente medos. As religiões vieram suprir essa carência de remédios contra o medo. A exemplo do combate ao fogo pelo fogo, elas vieram trazer a expurgação do medo com novos e mais exaltantes medos: Deus e o Diabo e numa ordem decrescente, os pais, os amos e senhores, que da terra se foram apoderando para garantirem a protecção dos mais fracos.
A PALAVRA sexo. Quantas desgraças, angústias, morticínios e vilanias. Juras desfeitas ao sair a porta da casa comum. O sexo da gaja do vizinho é melhor do que o da minha. O gajo do lado tem uma picha mais comprida e olha-me com olhos gulosos, é porque sou boa.
Enlamear-se em sexo. Chafurdar. Inventariar posições e desvarios conseguidos. Mentir e seguir para outra. Dizer amo-te quando já não há nada para amar. Só o sexo adivinhado nos lábios trémulos de prazer. Na ilusão de imagens trabalhadas para atrair.
A PALAVRA sonho. Estudada ao pormenor por especialistas da ilusão. A tentativa de nos fazer crer na bondade de uns e maldade de outros. Como se a palavra, desprendida de si própria, subsistisse. Fosse. E se tornasse numa realidade que objectivamos com o frenesim próprio dos incrédulos. Sonhamos no sono e dentro do sonho acontecem sonhos. Sonhamos acordados. Não é cisma. É sonho.
A PALAVRA democracia. Todos os regimes vivem em democracia, mesmo os totalitários.
Chamamos democracia a um estado onde as pessoas são todas inscritas como rebanho, com variantes de cor e tamanho. Ciclicamente chamam-nas a votos. Digladiam-se os grupos em promessas e programas de circunstância. Atraem com sedutoras miragens de bem estar. Cada vez são menos os que votam, Desenganados. E vamo-nos aproximando das democracias totalitárias. Só um grupo activamente interessado e conivente vai aos votos e elege os confrades que melhor lhes retribuirão a paga.
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